segunda-feira, 25 de março de 2019

Completude.




Por Vitalina de Assis.






Não me recordo quando foi a última vez que postei por aqui, e isto é uma verdade relativa, pois basta olhar a data da última postagem  para situar-me. Deixemos isto em outro plano, pois não é a ausência de publicação algo relevante, a relevância está em ter ou não algo para dizer. Outra relevância pontua-se: quem neste mundo, não teria algo a dizer? É mais relevante pensar que, talvez não se encontre quem queira ouvir ou se importar, e isto também se torna irrelevante, já que possuo dois ouvidos, dois bons vizinhos para uma única boca.

Você pode estar incomodado com a minha redundância e insistência na arte de relevar, mas deixe-me adjetivar em paz e desista de contar quantas vezes fiz uso desta palavra, porque isto também não tem relevância alguma. O que me move são momentos, pouco a ver com “inspiração”, porém, muito a ver comigo. A escrita me constrói e desconstrói na medida em que permito e hoje, dou-me a este desfrute. Nada me revela mais do que as letras que desenho livremente em um fluxo quase ininterrupto, João Cabral de Melo Neto disse: “Escrever é estar no extremo de si mesmo,” e de fato o é. Então, de muito pensar nesta ausência criativa por aqui, embora por cá, fora deste limite que se impõe,  meu ser borbulha de ideias e questionamentos internos, não que eu possua dúvidas quanto ao que vai em minha alma, no entanto permito que  as do entorno, se apresentem. Sou todas as respostas de que necessito. Basto-me eu em meu ser, supro-me eu em meu ser. Sinto-me implodir em mim, sem desconstruções, poeiras e entulhos naturais de uma implosão. Sou construção, sou descoberta, estou inteira.  Estou perplexa! Incompletude sempre foi a minha essência, então o que eu fiz com ela afinal? Onde abandonei a incompletude? Como não percebi tê-la largado em algum lugar? Quando me completei?

Um dia destes e deste momento não tenho a mais insignificante lembrança, larguei, joguei, perdi, fui roubada, sei lá - um pacote ofício pardo contendo  relatórios e um artigo em PDF - Os 72 Nomes de Deus - uma tradução que fiz do espanhol  que evaporaram-se, de minhas mãos e de minhas lembranças. Não fosse o caso, de um documento específico estar no meio e ser requisitado em um tempo posterior, minha memória talvez jamais se lembrasse de tal pacote. Fui abduzida neste dia. Juro, de nada me lembro do após - tomando-o em minhas mãos e seguir para casa.

Quão grato seríamos se alguns eventos de nossa existência, fossem evaporados assim. Consegues enumerá-los para abdução?  Fato é que fiquei preocupadíssima com minha responsabilidade, pois só poderia caber à sua ausência o meu ato de perder, esquecer e sequer lembrar-me, porém tudo passa e nada permanece imutável nesta nossa existência efêmera. Depois de tantos: “não sei o que aconteceu e nem tudo, se pode resgatar”, descansei, melhor, aceitei o que eu não poderia mudar de jeito algum. Aceitar parece um verbo descontextualizado em nosso viver, mas é perfeito para se conjugar e quando compreendemos isto, a leveza reside na porta ao lado e a culpa, sabe-se lá por onde anda. 

Aceitação não é sinônimo de acomodação, mesmo porque nossa natureza respirante tende a relutar ao novo, a ser resistência para o que se achega. Do conforto, haveremos de desconfortar em algum episódio de nossa existência e isto é tão mágico quanto surpreendente. Pense nisto. Aceitação é crescer dando-se conta desta expansão, que não é, e nunca será apenas corpórea, no entanto, muitas vezes sutil passa ao largo até que as medidas extrapolam e nos descobrimos à deriva de nós mesmos, à espera de um resgate, ou plenamente integrados à nossa essência de luz.

Tudo está em crescimento desde o dia em que nos aventuramos naquela corrida insana e quem sabe desleal, com os nossos pares para nos acomodarmos no útero de nossa mãe e de lá para cá, é imperativo crescer.